Encontrei minhas origens
(...)
Encontrei minhas origens
Na cor de minha pele
Nos lanhos de minha alma
Em mim
Em minha gente escura
Em meus heróis altivos
Encontrei
Encontrei-as enfim
Me encontrei.
Oliveira Silveira
Começo o texto com este singelo e profundo poema, de uma das grandes vozes em defesa dos negros no Brasil, o poeta Oliveira Silveira, no sentido de mostrar o encontro com a ancestralidade, com a história, com a negritude que existe em todos os brasileiros, com as negações que o povo negro sofreu e sofre na construção desse imenso país.
Para muitos, o dia 20 de novembro é apenas mais uma data, mas para quem teve e tem esse encontro com as origens da “minha gente escura” é um dia de profundas reflexões, de lutas, de comemorações, de buscas, hoje, que é dia de Zumbi dos Palmares, um dos nossos heróis altivos, e dia da Consciência Negra, é o dia para lembrarmos as atrocidades cometidas contra os negros durante a escravidão, do racismo que ainda corrói nossa sociedade e ceifa a vida de milhares de jovens, crianças, mulheres e homens nesse país e em vários lugares do mundo.
Hoje também é dia de lembrar dos cinco “nãos” históricos, que segundo Leonardo Boff, os negros e em geral a população pobre e marginalizada desse Brasil são vítimas. Primeiro veio a “colônia”, assim, fomos reduzidos a condição de não-povo; segundo a “escravidão” fomos levados a categoria de “não-pessoa”; terceiro a “exclusão social” que faz do ser pobre, preto um “não-cidadão”; o quarto é o “racismo” que coloca muitos seres humanos como desprezíveis, inferiores; e por último a “marginalização religiosa” que faz mulheres e homens serem indignos de serem filhos de Deus. E dessa forma, os negros foram arrancados de suas terras, de suas origens e transplantados como “bichos” enjaulados, maltratados, desnudos para Novo Mundo, esse, que foi sucumbido a ganância e a maldade do homem europeu, trazendo o mal da superioridade de uma cor e inferiorização dos demais.
Ser negro é uma batalha diária de afirmação, porque fomos acostumados nas escolas, nos lugares de convívio social que nossa cor não é bonita, que nossa pele é suja, que nosso cabelo é ruim, que nossas mulheres merecem empregos ínfimos, que nossos jovens precisam morrer todos os dias vítimas do tráfico, da violência, das drogas. Dizem que o nosso lugar não é nas universidades, que não merecemos ter uma profissão, uma família, uma casa, por que não temos “alma”, porque nossa pele é imunda, por que nossa religião é coisa do “demônio” que nossos orixás são coisas do mal, que nosso lugar é na favela, nos subúrbios ou nas prisões.
Mas diante de todos estes estereótipos que nos foram dados ao longo dos séculos, o que temos a dizer e a mostrar ao mundo é que nossa cor “Negra, Preta” é linda, nossas mulheres maravilhosas, nossos jovens são seres humanos como os demais, que nossos ritmos são contagiantes, que nosso axé traz a energia da vida, que nosso cartão de visita é a alegria de viver e mostrar que a cor da pele que nos veste não dever servir para diminuir as pessoas, que não importa se somos negros, brancos, índios, que nossas crenças sejam diversas, o importante é que somos humanos e devemos respeitar as diferenças na busca pela paz, paz entre as nações, paz entre as pessoas.
Assim como Martin Luther King “Eu tenho um sonho”, sonho de que as histórias dos nossos ancestrais negros façam parte do currículo escolar, que nossos jovens não morram vitimados pelo racismo que mata todos os dias, que nossas mulheres negras não sejam vistas apenas como objetos sexuais, empregadas domésticas e faxineiras, pois temos capacidade de termos qualquer profissão. “Eu tenho um sonho” de que minha nação não seja racista, preconceituosa e exclusiva, que busque a equidade entre os povos.
E para finalizar as reflexões desse 20 de novembro trago uma frase do nosso maravilho e saudoso Bob Marley “Enquanto a cor da pele for mais importante do que o brilho nos olhos, haverá guerra”
Por Ana Paula de Lima
Mulher, Negra, Brasileira